De vez em quando é só um nada

Natalia Assarito
3 min readAug 28, 2023

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Arte de Susano Correia

“Eu acredito no amor não pelo amor que eu recebo, mas pelo amor que eu dou” — Hortência

Talvez esse texto não fique bom porque eu tomei um pouco mais de remédio do que eu já tomo. Minha cabeça dói e, por algum motivo, quando a minha cabeça dói eu tomo ansiolítico e não advil. E normalmente ela melhora. Hoje não.

Eu conheci um cara que parece ser legal e eu fugi dele porque não consigo ser legal agora. Não lembro quando foi a última vez que eu consegui ser legal. E eu não quero mais me forçar a conhecer caras ou ter essa obrigação de ser feliz no amor.

Estou assistindo à série da Daisy Jones e ela é, pra mim, a personagem mais insuportável já inventada em toda história das séries americanas. Eu odeio a Daisy Jones. E me pego pensando o que que tem na Daisy Jones que ressoa em mim como um buraco vazio.

Ela é livre, faz o que quer e sempre no final as coisas dão certo. Ela compõe as músicas mais bonitas, tem a voz perfeita, um produtor excelente e uma banda incrível ao lado dela.

Tenho medo de falar isso, mas, milagrosamente, todas as coisas dão certo na minha vida também. Ah, mas a sua vó e sua cachorra morreram em menos de um ano?”. Vocês esperavam que elas fossem eternas? Esse tipo de merda acontece o tempo todo.

Sinto pavor de perder meu emprego. Muito mesmo. Eu não tenho direito ao seguro e meu fundo de garantia acabou depois do meu período sabático de 7 meses. Ser mandada embora hoje é não ter, literalmente, um centavo pra pagar minhas contas.

Contudo, eu tenho essa fé estranha. Essa certeza que não vai acontecer nada de difícil porque tudo sempre dá certo na minha vida.

Menos quando eu falo de amor. E eu me sinto incapaz e confusa e sem traquejo social. Meu raciocínio é lento e eu sou tímida. Travada.

Ao contrário da Daisy Jones que é livre e sempre faz o que quer – e a impressão que fica é que o que ela quer é que dê errado (eu ainda não cheguei no final da série, então, não sei).

Vi essa arte do Susano Correia (eu amo as artes dele!) e ela conversou demais comigo. Talvez eu nunca consiga um novo amor porque não quero que ele fique nas sombras das ruínas do anterior. E eu não sei como fazer o trauma passar.

Todos os homens que aparecem eu coloco um defeito que se torna algo imenso e me impede de seguir em frente. Dessa vez não me dei nem ao trabalho de tentar. Ia fazer 12° de temperatura com chuva; fico muito nervosa em dates, me dá tremedeira, dor de barriga, vontade de chorar e me esconder.

E, do fundo do coração, eu acho que a culpa de tudo isso é minha. Porque podem terem sido muito errados comigo. Porém, a vida não é o que fazem da gente. A vida é o que nós fazemos com o que fazem da gente. E, em algum momento, eu internalizei inconscientemente que eu não ia conseguir seguir em frente.

Eu fiquei presa nessa merda.

Me esforço muito pra ser incrível e agradável e disponível com todo mundo. Me custa bastante tempo, dinheiro, carisma e saúde mental fazer com que as pessoas gostem de mim. Minha psicóloga na última sessão trouxe um nome de transtorno pra isso: people pleaser. Ela me disse que eu tenho uma questão gigante com ser people pleaser — caguei, não levo a sério um transtorno que não tem nome em português e acabou.

Entretanto, hoje, meu maior sonho é estar indisponível. É passar um dia sem responder as mensagens no instante exato que elas chegam. Finalmente, me priorizar.

De vez em quando é só um nada.

Cortei meu cabelo bem curto junto com a ilusão de que vai ser diferente. O lítio faz efeito e eu começo a gostar de usar roupas básicas e sinto cansaço e ouço músicas mais calmas.

De vez em quando é só um nada.

E eu não sei nem mais o que eu tô escrevendo.

Sou feliz, alegre e forte

Tenho amor e sorte

Aonde quer que eu vá

Sou feliz, alegre e forte

Tenho amor e sorte

Aonde quer que eu vá

Marisa Monte

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Natalia Assarito

cientista social. Transformo angústias em texto. Instagram: @nanaleitora