Natalia Assarito
3 min readSep 4, 2023

Sofrer de ausências

Do mercado: embrulhado e imperfeito

Quinta-feira à noite, dois dias atrás, fui demitida — novamente — e de surpresa. Foram dois meses e meio de trabalho, eu nunca tive um feedback ruim, apenas positivos. Minha chefe disse que percebeu que não fazia sentido manter uma cadeira como a minha, mas que eu sou maravilhosa e a pessoa mais resiliente com quem ela já trabalhou nos 16 anos de sua carreira. E que ela estava muito triste.

Eu chorei enquanto ela me demitia.

Eu chorei na frente dela.

Porque ela foi a melhor chefe que eu já tive e eu me mudei em julho e comprei todos os móveis da casa nova parcelados em mil vezes e eu contratei uma faxineira que também depende de mim pra sustentar seus filhos e netos e eu tinha começado a fazer academia com afinco e estava tudo bem. E, principalmente: porque o mercado está tenebroso e meu dinheiro guardado acabou no meu período sabático. Eu não acredito que eu tô chorando de novo. Realmente estava tudo bem e era a primeira vez que eu me sentia plenamente saudável em um trabalho.

Vai ser difícil segurar a barra. Financeiramente e psicologicamente.

Nunca senti tanto medo na vida.

Eu não sou uma pessoa propriamente positiva, eu não sou nada positiva nos meus dias. Mas, o curioso é que ao mesmo tempo que estou triste, estou empolgada com o que vai vir pela frente. Quero voltar a ter amigos de trabalho (eu trabalhava sozinha no meu quarto), ter uma rotina mais organizada, aprender coisas novas.

Ontem eu saí com as minhas amigas para espairecer, fomos num bar-balada-karaokê (só Deus sabe como eu odeio karaokê) e tinha um homem MUITO bonito cantando. Eu sentei porque meu pé estava latejando de dor (pra variar) e me peguei olhando pra ele e sorrindo, pensando que em algum lugar meu namorado tão legal já está por aí e que eu nem vou sentir ausência quando ver um cara bonito cantando no karaokê.

Sofrer de ausência é a pior forma de machucar a si mesmo. É sofrer pelo trabalho que, de repente, não deu certo. É sofrer pelo namorado que não chega nunca. É se torturar pensando ser incompetente em todas as esferas da vida. E, quando qualquer arranhão acontece, sangrar.

Sei lá, agora que eu não sou mais doida, eu não gosto mais de gin. E eu vejo as coisas com mais clareza. Pela primeira vez eu percebi que está tudo bem ser solteira há 7 anos e que não está sempre tudo bem não ter um trabalho. No final do dia, o que a gente merece é que coisas bonitas nos aconteçam.

Estou apavorada, porém empolgada pra recomeçar. Me matriculei em alguns cursos, vou retomar o inglês pensando em business. Comprei um girassol no mercado. Estou conectada com o meu propósito. O que vai vir será muito mais incrível do que o que foi.

Não existe fim do mundo. E, se tiver, eu sou a rainha do caos.

E eu, já que não posso mesmo fazer coisa alguma, tomando o meu uisquinho. O medo é enorme. Mas entre medo sem uísque e medo com uísque, prefiro a segunda alternativa. Na vida é assim: tudo vai mal, mas preciso que o corpo e a alma sejam um centro de tranquilidade. — Rubem Alves

Natalia Assarito

cientista social. Transformo angústias em texto. Instagram: @nanaleitora