Strawberry Champagne All Night — Bruno Mars e Bauman

Natalia Assarito
4 min readSep 13, 2023

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O texto de hoje tem embasamento que vai além das vozes na minha cabeça

Como toda boa estudante de sociologia, li Amor Líquido no meu segundo ano de faculdade. Não foi uma leitura obrigatória, mas estava curiosa pelo hype do Bauman. Lembro de não concordar 100% com o que estava contido naquelas páginas, porém fiz uma pancada de anotações. Até que eu envelheci e envelheci como uma mulher solteira e sozinha.

“O medo e a insegurança de se relacionar leva os homens a entrarem em contradição: ao mesmo tempo em que desejam algo sério, almejam um relacionamento fácil de terminar. As relações sociais passam a ser pela Internet, onde há sempre a tecla delete.” — anotação minha trazendo a introdução geral do que se trata Amor Líquido, de Bauman.

Apaguei todos os meus apps de namoro/paquera/seja lá do que você queira chamar. A decisão veio depois de, finalmente, eu ter encontrado um cara bastante legal, com 1.90m de altura, interessante, que tinha ideias parecidas com as minhas, atencioso, que demonstrou se interessar por mim e, acreditem, eu ter dado uma leve grande surtada no dia do date. Tive febre e recaída na depressão. Fiquei fisicamente mal com a ideia de um date.

Pensei que podem ter inúmeros motivos pra isso: eu ter aprendido que não sou digna de ter alguém legal ao meu lado; a insegurança por ser mulher e ir encontrar um desconhecido que, por mais que tenhamos conversado antes, ainda é um homem e um homem é um perigo constante pra uma mulher; meus medos antigos de parecer ser desinteressante ou burra (eu tenho pavor de parecer burra na frente das pessoas). Até que eu percebi que um date deveria ser legal e não um peso. Então, não fui.

Me cobro demais por nunca ter dates, mas, a verdade é que não faz tanta falta assim — ou faz, eu não consigo me decidir e essa contradição está em Bauman:

“A incapacidade de escolher entre atração e repulsão, entre esperança e temores (…), comer o bolo e, ao mesmo tempo, conservá-lo; desfrutar as dores e as delícias de um relacionamento evitando, simultaneamente, seus momentos mais amargos e penosos.” — P.9

Me lembro que eu fiz um único plano para 2023: não ter fé no amor (eu deveria ter organizado uma maneira de ter um bom emprego, mas ok). Parece horrível pensar que meu maior desejo é não acreditar no amor, mas eu estava cansada de sufocar nas minhas próprias expectativas. Cada novo cara que surgia era uma nova fanfic. E eu sofria quando um laço líquido se rompia. Sou dessas que demonstram de menos, mas se envolvem demais.

Pode entrar, Bruno Mars: como é possível viver uma época em que se há aversão à criação de laços e, ao mesmo tempo, existe Bruno Mars cantando coisas lindas sobre como é maravilhoso amar — ele faz até a dor do amor parecer bonita. Anedota engraçada: eu namorei uns 5–6 anos quando era novinha, um dia estava tocando “treasure” no carro, eu perguntei se era o treasure do meu namorado e ouvi um sonoro “NÃO” (é o tipo de coisa que uma garota nunca esquece rs).

Enfim, estou ouvindo Bruno Mars enquanto escrevo esse texto e ele acabou de dizer “I think I wanna marry you” (“eu acho que quero me casar com você”). Bauman, entenda, eu quero um amor cafona, mas não cafona que me faça passar vergonha em público, cafona só daqueles que a pessoa verdadeiramente QUER passar tempo comigo. Vocês já repararam como é cada dia mais difícil encontrar alguém que queira passar tempo de qualidade com você?

“Nada de apaixonar-se… Nada daquela súbita torrente de emoções que nos deixa sem fôlego e com o coração aos pulos. Nem as emoções que chamamos de ‘amor’ e nem aquelas que sobriamente descrevemos como ‘desejo’. Não se deixe dominar e nem arrebatar e, acima de tudo, não deixe que lhe arranquem as mãos da calculadora” — P.37

Engraçado o caminho que esse texto foi tomando — eu realmente acredito que o texto é um ser vivo e que eu sou só uma ferramenta para ele existir. Enquanto Bauman é um choque de realidade, o escancaramento dos nossos dias e relações, Bruno chega pra dar esperanças que talvez algum dia alguém queira Strawberry Champagne All Night com a gente. Eu amo as contradições que é ser um ser social.

E quanto à mim, sigo, agora com menos fé, e sem apps, esperando meu “Piloto”, como diria Flora Matos, cair do céu (vai saber, né, é no céu que pilotos ficam).

Meu amor, se eu te perder é pra ter que encontrar
Quem sabe eu te encontre lá em Salvador
No carnaval quando você for lá
Se for pra ser acho que demorou
Minha nave voa por tanto lugar
Seu coração é o meu aeroporto
Pra viajar tem que passar por lá
Pra pilotar só sendo meu piloto, caprichoso
Cuidadoso e amoroso, um bom moço
Estudioso, atencioso, corajoso
Um companheiro, verdadeiro
Um escudeiro, sem receio
Se precisar, perigoso — Piloto, Flora Matos

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Natalia Assarito

cientista social. Transformo angústias em texto. Instagram: @nanaleitora